quinta-feira, 9 de julho de 2015

Um dia na vida de António Salazar

“Lisboa, 8 de Julho de 2015


Nem um galinheiro, nem um chafariz, como está diferente Lisboa! A Praça da Figueira sumiu, tal como os mercados das Picoas e da Ribeira. Já não há guardas sinaleiros, varinas e magalas a partir para o Ultramar na Rocha do Conde Óbidos!


Espreitei S. Bento, incógnito nas galerias, uns fedelhos gritavam sem respeito uns pelos outros, até uma loira (falsa loira, cheira-me) preside hoje à Assembleia Nacional. Que saudades do Albino dos Reis, do Santos Costa, e das omeletas da Maria, pela manhã em S. Bento.


Vim de Santa Comba no Intercidades com umas jovens que diziam ser amigas do Erasmo, coitadas das piquenas, não sabem que já morreu, vou contar esta ao Cerejeira. Onde se terá enfiado o safardana, sempre atrás de soutiens rendados? E pretos!


Mudou muito, Lisboa. Fui passear de triciclo, um rapaz de brinco levou-me numa caranguejola chamada tuk tuk- estranho nome- a visitar a cidade. Agora metem queijo no pastel de bacalhau, vejam só, e mudaram o nome à ponte, depois duma Abrilada feita pela soldadesca.


Quis ir ouvir a Amália, mas parece que morreu, e está no Panteão, junto com o traidor do Delgado e com o Eusébio, um jogador da bola de Lourenço Marques. Sítio mal frequentado, cruzes, maldita a hora em que terminaram as obras de Santa Engrácia.


Melhoraram , as mulheres de Lisboa. Recordo a minha primeira vez ainda seminarista em Coimbra, com a Felismina. O Manuel, hoje cardeal, ficou de guarda, enquanto, ardendo em fé, penetrava os húmidos desígnios de Deus.


Muitos pensam que sou um bota-de-elástico, mas nada, até aprecio um bom teatro, e boa música, zarzuelas sobretudo, não vejo nenhuma no Coliseu, só anúncios a um tal Nos Alive, deve ser coisa ligada ao Churchill, é em inglês. Alguns mal-intencionados zurziam contra o tio António porque que prosseguia sem desvio a missão que a Providência lhe confiou, mas ignoram o que é ser português das quinas e cristão temente a Deus e à Providência. Jacobinos duma figa, até o Papa é um dançarino de tango encharcado em cachaça. Está tudo perdido!


Reparei que falam pelas ruas duma tal troika, pensava ser Fado, Futebol e Fátima, mas depois que me contaram, percebi: espatifaram o ouro e entregaram as colónias, fiquei para morrer quando me contaram, ia caindo da cadeira (outra vez!) numa casa de carne picada, um botequim chamado McDonald’s onde em vão pedi uma patanisca e um branco. Mas não mandam esta gente para o Tarrafal? Um empregado dum café diz que os rapazolas de S. Bento vão para Bruxelas a toda a hora. Então e Sá da Bandeira? E Quelimane? E Porto Amboim? Quem está lá agora, a escorraçar os turras, e a expandir a Fé?


Há que voltar para Santa Comba, rápido, que isto é uma terra de loucos desalmados. Crianças, mal vi, os bolchevistas devem-nas ter comido ao pequeno almoço, dizem-me que se divertem com uma ardósia moderna chamada Playstation.


Aproxima-se uma velha, diz que me reconhece de algum lado. Nego, claro. Que sim, que me viu num filme do Ribeirinho, a caminho do Torel, preso. Santa ingenuidade! Para o Torel preso, só se fosse às minhas ordens, e de marcha a filambó. É o que dá verem muito dessa telefonia com imagem, a que chamam televisão. E há umas coisas chamadas tabletes, perguntei se eram suíços, mas não, é só para passar com um dedo, e sem lamber.


Portugueses: ensinai a vossos filhos o trabalho e a vossas filhas a modéstia, elas que deixem os livros de auto-ajuda e o Facebook. E se não poderdes fazer delas santas e castas, fazei delas ao menos cristãs e fadas do lar.


Volto para casa. Acabaram com o papel selado, o mata borrão, o selo branco, as máquinas HCESAR, que faria eu aqui, sem mangas de alpaca e leais servidores, sem o Rosa Casaco e o bom do Barbieri? Parece que vivem em democracia, e gostam da rambóia. Vou-me embora, enquanto a dita dura.


António Salazar  
ditadorantonio@vivaapide.com
Professor de Moral em Santa Comba Dão”