O
inspector Luís da Rosa chegou à cena do crime pouco tempo depois de o João
Luís, da brigada de homicídios ter ligado para ele, ainda terminava uma
fresquinha no Saloon.
-Vem para Colares, depressa, um
tipo foi encontrado morto. Assassínio!
Antevia
que aquele crime iria dar que falar. No local, uma moradia no Banzão, em cima
da cama, fora encontrado morto e seminu um homem com cerca de trinta anos,
sangue escorrendo da testa. Um tiro na nuca, pareceu à primeira impressão.
-Há algum relatório?-
mecanicamente, Luís abria mais um caso.
-Dra Helena!
-gritou João Luís – traga a papelada para
o inspector, por favor!
A
médica legista trouxe um relatório preliminar e entregou-o ao polícia, que se
deteve apreciando os olhos verdes da estagiária, nunca a vira na sede.
-Filipe Rabaçal! – Luís leu, e parou um
minuto, olhando para João Luís- Hum… não é o antigo futebolista que agora
escrevia para o Record? –refrescando a memória, lembrou o falecido, por
vezes também comentava para a Sport TV -Não
foi ele que andou aí nos jornais por causa de um divórcio complicado?
-Foi sim, era casado com uma top model, uma
Sofia …– sempre a olhar para o telemóvel, João Luís tentava juntar dois
mais dois.
-Sofia Leal Bandeira –adiantou Helena,
bem informada –ainda recentemente
desfilou na Moda Lisboa. Os polícias olharam para a médica legista,
admirados, que foi explicando:-Eles eram
casados já há algum tempo, mas andavam meio brigados, ela ameaçava dar uma
entrevista onde ia revelar que ele era homossexual e lavar um pouco de roupa
suja, sabe como são estes meios…
Luís
ficou olhando para a médica, além de vistosa, era observadora:
-João Luís, manda sair toda a gente, quero
ver bem a cena do crime, com certeza que deixaram passar alguma coisa. Isto é,
se não tiverem estragado tudo já!
A
sós com o defunto, puxou dum cigarro, e ficou mirando a cena macabra. Ajuste de
contas por certo. Fitou o morto, já esbranquiçado e murmurou umas palavras:-Tinhas tudo e limparam-te o sebo, não foi?
Quem é que te matou, grande cabrão?
Calçou
as luvas e fixou-se na busca de uma pista que ajudasse a fazer luz. No quarto
havia uma cama redonda e um plasma gigante, um computador portátil estava em
cima duma mesa. Abriu-o, havia um texto inacabado intitulado “ Toda a verdade sobre o futebol português”,
seguido de apreciações sobre a corrupção e os estratagemas dos clubes, os jogos
de poder nos bastidores, nada que não se soubesse. No chão, um porta-chaves,
com umas iniciais.
-Isto está fácil demais! -comentou,
mirando, era em pele, e tinha umas iniciais, SLB.
-Sofia Leal Bandeira! Claro, é óbvio!
-pensou, apertando as chaves na mão – João
Luís! -chamou, para a sala ao lado -arranja
um mandato. Vamos prender a mulher do gajo para averiguações! No chão,
vestígios de um cigarro, a criminosa tivera tempo para fumar. Helena, também
chamada, recolheu o porta-chaves e a beata em sacos de plástico. Antes de sair,
ele ainda se meteu à graça:
-Olhe, eu…sabe… já viu o último
filme do Johnny Depp? Se não tiver muito que fazer logo…. podíamos discutir o
caso depois….
-Tudo bem, inspector –sorrindo
dengosa, Helena aceitou, o inspector era divorciado e já lhe havia chamado a
atenção. Um homem esbaforido entrou
na sala nesse momento, usando um fato de marca, mas em desalinho, com a gravata
à banda. Luís e Helena estranharam, entreolhando-se:
-Ei amigo, o que é que você está
a fazer aqui? –ralhou o inspector Luís da Rosa. -Isto é a cena de um crime. Quem o deixou
entrar?
-Desculpem, o meu nome é João Varandas, era
muito amigo do Filipe. Meu Deus, que coisa horrível!
-Você não é jornalista desportivo?
–observou João Luís, já o vira em programas desportivos na televisão.
-Sou sim. Eu e o Filipe estávamos a escrever
uma biografia do Figo juntos, mas agora infelizmente…que tragédia!
-Qual é mesmo o seu nome?
–questionou o inspector Rosa.
-João Varandas. Escrevo para o Record e
também colaboro com a Sport TV, mas tenho um mestrado em transportes!-
nervoso, puxou dum cigarro, oferecendo aos presentes. Luís recusou primeiro,
mas depois mudou de ideias:
-Na verdade, quero um, sim –disse,
estendendo-lhe a mão. Ele sacou do maço e deu-lhe um cigarro, acendendo-o com
um isqueiro amarelo. O inspector examinou-o discretamente, e reparou que a
marca do tabaco era diferente da beata que tinham encontrado no chão, o
jornalista estava bem vestido, embora amarrotado.
Naquela
noite, Luís e Helena foram ao cinema, cearam depois no Cascaishopping, Helena quis saber coisas acerca dele.
-Então e nas horas vagas? Que costuma fazer?
-Trata-me por tu -criava clima, o polícia
- Bem eu gosto de futebol, torço pelo
Sporting e também pratico karatê. E tu?
-Eu gosto muito de ler e viajar.
Ah, mas sou do Benfica…
-Ninguém é perfeito! -sorriu, complacente
-Sabes, aquele crime, ainda não me saiu
da cabeça.
-Sim, mas as iniciais SLB, são uma prova
forte, não?
-Não sei, SLB pode querer dizer muitas
coisas. Sport Lisboa e Benfica, por exemplo, ele não era jornalista desportivo?
Num
impulso, Luís segurou-lhe a mão e foi correspondido. Saíram do restaurante de
mãos dadas e passearam um pouco, e depois sentaram-se, conversando. Quando
olhou em frente, na montra da Bertrand viu um livro acabado de editar, a História do Futebol Português de João
Varandas. Levantou-se, e foi ver de perto, folheando-o, tinha uma capa simples,
branca, com o nome dele a preto.
-Este não é aquele amigo do
Rabaçal que apareceu hoje de manhã no Banzão? -raciocinando
rápido, Lacerda comentou com a legista:
-Acho que prendemos a pessoa errada!
–comentou, enquanto sacava do telemóvel- João
Luís, arranja-me um mandato, e prende o
Varandas para interrogatório!
Na
manhã seguinte, na Judiciária, Luís apertou com o jornalista:
-Por que matou o Filipe Rabaçal? Confesse e
será melhor para si, porquê?
-Como podem provar que fui eu? –tirado da
cama manhã cedo, Varandas suava em bica, nervoso.
-Você descobriu que o Filipe andava a
escrever um livro que questionava tudo o que você escreveu sobre o futebol
português. E o manuscrito dele fala em si, e de que maneira! -exibindo uma pen, Luís da Rosa sacara o texto ainda
incompleto do novo livro, onde eram revelados episódios envolvendo Varandas na
adulteração de resultados desportivos. O livro sobre Luís Figo nunca existira,
o próprio Figo atestara-lhe pelo telefone que conhecia os dois, mas que
ultimamente até se andavam a dar mal.
-Isso é tudo circunstancial! Quero um
advogado! Chamem o doutor João Afonso!
-Ainda não terminei, senhor Varandas. Está a
ver este porta-chaves? - Luís sacou da prova recolhida no quarto no dia
anterior - Aqui em caracteres muito
pequenos tem um número de telemóvel. Acho que é o seu, correcto?
Varandas
empalideceu, mais tarde, em verificação directa, uma das chaves era a do seu
carro, daí o ter chegado à casa de Filipe de fato, mas desarranjado. Depois de
ter disparado sobre ele, andara pelo pinhal à procura das chaves desaparecidas
e retornando ao local do crime em busca delas, deu com a polícia já lá, chamada
por uma vizinha que ouvira o tiro, havia que fingir surpresa.
No
domingo seguinte, Helena e Luís da Rosa voltaram ao cinema. Passando pela
Bertrand, os escaparates publicitavam agora uma biografia não autorizada de
Jorge Nuno Pinto da Costa, prometia revelações escabrosas. Ou se enganava muito,
ou breve teriam mais trabalho pela frente...
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