segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

No aniversário de um corvo




Era noite, lunar e cintilante, na finistérrica falésia junto à mata atlântica, um exilado corvo, apátrida de nações, e arauto de futuros que não virão, deambulava, subindo a Caverna, onde explorador buscava a Luz redentora que lhe devolvesse as palavras, capturadas pelos dias, imanentes e expectáveis. Liberto na Caverna, viajara ao Futuro e indomado voltava ao seguro eremitério de cheiro a pinho e a mar, depois de peregrinar por sinuosas grutas, espeleólogo de amarguras. Arqueólogo da ansiedade, voltava à Serra-Mãe que de novo acolhia o filho pródigo. Uma poção fervilhava no caldeirão, apurando, mas não era hora ainda de soltar a Palavra. Faltava o Fogo. O Fogo quente e aconchegado, castigador e puro, vulto ainda apenas, como fauno na noite. Na escuridão, buscava Claridade, encontrando-a, faróis pirilampos  o guiariam ao  promontório-útero onde virariam Fogo, na Luz amenizando a noite céltica.
Essa noite ainda uma pomba o visitaria, parceira de passeios pela falésia sonhando inventados futuros em gritado silêncio. Estoicos e eremitas, absortos sonhavam com a Elba Lunar para onde uma manhã partiriam, labirínticos e trágicos.
Já várias vezes qual corvo anacoreta morrera, e logo como Fénix renascera, tecendo promessas à Luz vaginal. A Lua Cheia ajudaria a soltar aferrolhados silêncios do Cofre do Tempo, juntos e junto ao mar várias vezes ambos haviam partido em barcos para Ítaca, onde formosas Penélopes os esperavam tecendo novelos, para à noite os desfazerem, renovando o Princípio e o Fim, o Alfa e o Ómega. Finda cada Viagem, voltavam, renovados conquistadores da Luz.
Naquela noite, a Lua púrpura de Sintra esbatia a claridade sobre o promontório. Cansado, o corvo sentou-se num penedo de urze, olhando-a. Atlântido bardo do Futuro, na noite do Tempo enviaria poemas mágicos pelo bico duma pomba que buscava a Finisterra.

Sem comentários:

Enviar um comentário