-Sabes, bom Magnus, bem andou o Althing autorizando os karls a partir para a cruzada -refletiu Sigurd, rei de Bergen, a quem fora autorizada a expedição aos Lugares Santos, libertados por Godofredo de Bulhão e agora nas mãos de Balduíno, rei de Jerusalém.
-O
povo está contigo, e os homens também, Sigurd Jorsalafari. Oslo, Kaupang e
Gokstad enviaram os seus melhores combatentes, com o nosso sangue resgataremos
a terra sagrada! -prometeu Magnus, leal companheiro de
armas, enquanto o drakkar apontava a
sul.
Sigurd,
filho de Magnus, desde 1103 governava a Noruega, junto com Oystein e Olaf, seus
irmãos. Depois de acompanhar o pai às Orkney e aí feito conde e senhor, como
conquistador dos pictos e de Man foi celebrado. Agora, e com apenas
dezassete anos, largava de Bergen com sessenta drakkars e knorrs e seis
mil guerreiros, em apoio de Jerusalém, que havia que manter cristã. Era o ano
1107 da era de Cristo.
O drakkar almirante, com velas vermelhas e
brancas, lançou-se na imensidão fria, altivo e desafiador, aguerridos, os
homens remavam qual orquestra marcial, obedecendo ao encarregado do leme e
seguro maestro do navio. Breve acostaram a uma terra moura, Vigo, na costa da
Galécia, onde se detiveram uns dias, navegando depois para Ushbuna, na
taifa de Badajoz.
Já
perto dumas arribas escarpadas, fogueiras crepitantes denunciaram uma aldeia
moura, e com os infiéis desprevenidos, decidiu-se o ataque. Sem sereias
atraindo os navios para as rochas, adentraram-se, e navegando por um rio
estreito acima, bordejado de pomares com maçãs de vários palmos, chegaram enfim
à pequena aldeia. Filhos de Mafoma com arados cultivavam as terras e tiravam água
de azenhas puxadas por mulas, decidido, Sigurd achou por bem atacar, e para
tanto fez sinal a Magnus. Ancorados junto a um braço de rio rodeado de hortas,
encetaram a ofensiva, empunhando machados e lanças. Surpreso ao ver a frota, um
mouro ainda gritou ao muezzin
para que alertasse a
aldeia, mas era tarde. Munidos de espadas e ávidos de sangue, os homens
de Sigurd perseguiram e logo mataram dez deles, que lavrando com a charrua não
puderam escapar, pegando de seguida fogo aos palheiros e pombais. Mulheres que
teciam fugiram em pânico, e os corvos sobrevoaram a aldeia, onde uma matilha de
voz estranha fez presúria das fazendas e das mulheres, eterno ditame dos
vencedores sobre os vencidos.
Em
duas horas, a terra a que os mouros chamavam Colares caiu às ordens de
guerreiros de cabelo amarelo. Ululantes, os bebedores de hidromel logo
devassaram os casebres, fazendo do rio cristalino uma imensa poça de sangue caída
a noite, e fugindo os que não morreram, festejaram com bois assados, atolados
em cevada quente.Nos dias que se seguiram obrigaram a esvaziar os lagares e
moinhos, jovens foram arrebanhadas pelos vândalos, e carneiros recolhidos a
bordo, para a viagem. Também o castelo de Xintara sofreu ataques, e sem defesa
à altura, pouco tempo resistiu. E assim passaram duas luas cheias, até que,
saciado, Sigurd ordenou que partissem.
Detiveram-se
em Ushbuna, que igualmente saquearam, e em Alcácer, depois, descendo pela costa
para passar ao Mediterrâneo. Sigurd, tudo encarou como leal braço do Deus
crucificado, e que só castigando os infiéis poderia honrar, esgrimindo a
espada e venerando a cruz. Passadas as Baleares e a Sicília, finalmente
encontrou Balduíno, e por ele foi batizado no Jordão. Dois anos depois, eram
1110 anos da era de Cristo, cobriu-se de honra em Sídon, e ganhou uma relíquia
da cruz de Cristo.
Partiu
depois para Chipre. Três longos anos levava longe das neves do Naeroyfjord, peregrino
pelas areias do Levante, quando finalmente tornou a casa, onde muitos anos ainda
continuou lutando pela cristandade, até que, corria o ano de 1130, e vigésimo
sétimo do seu reinado, soprando um vento gélido e polar, o Cristo da Cruz o
levou para a Valhalha dos povos do
Norte. Ainda hoje a Heimskringla,
heróica saga dos reis nórdicos, recorda Sigurd, o Cruzado, um dia
vencedor de Sintra:
From Spain I have much news to tell/Of
what our generous king befell/And first he routs the viking crew,/At Cintra next the heathens
slew;/The
men he treated as God's foes,/Who
dared the true faith to oppose./No
man he spared who would not take/The
Christian faith for Jesus' sake."
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